Reportagem Fotográfica A comunidade de Vila Esperança, em Vila Velha, nasceu em 2016 como um projeto para garantia de moradia digna e combate aos altos custos dos alugueis de imóveis. Desde então, os moradores constroem casas, planejam ruas, criam vínculos comunitários e trabalham para que o local seja um espaço não somente de moradia, mas também de prosperidade social. Houve diversas tentativas de expulsão da população de Vila Esperança, movidas por escancarados interesses industriais e imobiliários. A Prefeitura de Vila Velha ainda apresenta resistência para reconhecer a região como bairro oficial. Vila Esperança conta apenas com o que a comunidade foi capaz de construir. Sem saneamento básico, rede elétrica e transporte público a permanência no território é somente um dos diversos obstáculos a serem superados. Mesmo diante de um cenário nebuloso, 800 famílias persistem na luta pelos seus lares. A comunidade se mantém unida na esperança de um futuro digno. Segundo Adriana Paranhos (também conhecida como Baiana), coordenadora do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) e Presidente da Ocupação Vila Esperança: “As crianças de hoje são o futuro da cidade, do amanhã. A gente continua batendo na mesma tecla, o direito de moradia e o direito também de viver com dignidade que não estão tendo. Nós não temos água, não temos acesso a energia. Tudo o que nós temos aqui hoje é improvisado, feito pelas nossas próprias mãos.” Fotografia: Eduarda Fernandes
Infância digital: quando a brincadeira é ganhar milhares de views
Em um cenário onde um terço dos usuários da internet são crianças, o carisma infantil vira matéria-prima para um novo mercado, movido a publicidade, contratos e a busca incessante por engajamento. As novas gerações parecem já nascer programadas para a vida digital, imersas em um universo onde as telas são extensões de suas vivências. Não é exagero afirmar que parte significativa da infância atual ocorre de forma online, um cenário comprovado por dados de 2023 do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef): um em cada três usuários da internet é criança. Em paralelo, a criação de conteúdo em redes sociais viralizou e tem produzido um volume exponencial de influenciadores, profissão predominantemente adulta mas que hoje já alcança massivamente o público infantil. Em alguns casos, essa produção de conteúdo ocorre de forma orgânica e natural, como uma genuína brincadeira que reflete os desejos e a individualidade da criança, tendo como principal propósito promover o entretenimento e a conexão entre pequenos de todo o país – e, por vezes, do mundo. “O brincar é muito importante para o aprendizado da criança, se tornando uma ação capaz de reproduzir a sua vivência diante da brincadeira, possibilitando o processo de sua aprendizagem, facilitando o aperfeiçoamento da criatividade, constituindo desta forma a assimilação entre o brincar e a aprendizagem.” destaca Lacir Mendonça Trombini em sua monografia para conclusão de sua especialização em Educação: Métodos e Técnicas de Ensino na Universidade Tecnológica Federal do Paraná, 2012. Os influenciadores mirins cativaram a internet e desde então realizam publicidades, cumprem contratos e alcançam números elevados de seguidores a partir da expressão do carisma e espontaneidade característica do ser criança. Embora a digitalização na infância ofereça inegáveis benefícios educativos e comunicacionais, como ferramenta de auxílio na aprendizagem, no desenvolvimento da fala e socialização da criança – segundo uma pesquisa realizada por estudantes de Psicologia da Universidade de Gurupi em Tocantins – é preciso ter cautela para a exposição online dos pequenos. Diretrizes do ECA Se para adultos, o mundo virtual já apresenta perigos latentes ao bem-estar e saúde mental do indivíduo, quando incluímos a vulnerabilidade do público infantil é necessário que a busca pela segurança digital seja constante. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) detém diretrizes essenciais para entender os direitos próprios da infância. Aplicados ao contexto virtual, é possível perceber como a expressão artística online se transformou numa categoria laboral. Conforme artigos acadêmicos, pesquisas científicas e projetos de lei como o PL 2.259/2022 que busca estabelecer regras para o exercício da atividade de influenciador digital mirim, é evidente que essa nova modalidade necessita de urgente regulamentação. O Art. 149 do ECA exige autorização judicial para trabalho artístico, mas ainda surgem divergências sobre a inclusão dos influenciadores mirins neste grupo. A discussão ainda está tramitando por Tribunais do Trabalho, Câmara de Vereadores e demais instâncias que permitirão encaixar a classe de influenciadores mirins nos contextos trabalhistas para fins artísticos, demandando um alvará para futuras crianças e adolescentes que desejem praticar a profissão. O documento “O trabalho infantil artístico nas redes sociais: Como a legislação atual pode proteger crianças e adolescentes no ambiente digital?” elaborado pelo programa Criança e Consumo, iniciativa criada pelo Instituto Alana (organização da sociedade civil, sem fins lucrativos), analisa as atividades dos criadores de conteúdo mirins no que tange a legislação brasileira e propõe medidas para a proteção do público infantil. A análise destaca que no caso dos influenciadores mirins apresenta-se um fator estimulante-compulsório na criação de mídia para a internet. Isso ocorre porque a criança influenciadora deve ser ativa nas redes, interagindo frequentemente com seus seguidores para garantir engajamento, além de ser submetida a gravação de peças de publicidade para empresas anunciantes. Por isso, além de manifestação artística, a atuação da infância na criação de conteúdo requer uma disciplina de trabalho, o que pode gerar sobrecarga de atividades causando danos ao bem-estar da criança. Neste sentido, o documento reforça que “verificar a existência e promover a realização dos alvarás judiciais são responsabilidades das empresas que mantêm as redes sociais e plataformas digitais, bem como das empresas anunciantes, que auferem lucros com o trabalho dos influenciadores digitais mirins, na medida em que eles atraem novos públicos para as plataformas e as tornam mais atrativas às empresas anunciantes, que, por sua vez, se beneficiam pela divulgação de seus produtos e serviços.” Pais e responsáveis legais das crianças que atuam no ramo artístico infantil devem procurar a regularização da atividade infantil, visando o bem-estar e os direitos dos menores. No entanto, a ocorrência de casos notáveis de exposição online de crianças e adolescentes, inclusive durante a gestação, pode suscitar um debate significativamente mais extenso sobre os responsáveis pela criação desse conteúdo. Lua chegou ao Youtube antes de nascer O maior exemplo de crianças que começaram a ser expostas nas redes antes de nascer talvez seja o de Lua, filha da influenciadora Viih Tube e do seu marido Eliezer, que direcionaram a criação de conteúdo para crianças e famílias através de seus perfis profissionais e de um perfil criado para a pequena. A conta da pequena de dois anos acumula 2,6 milhões de seguidores e impulsionou a criação da marca TurmaTube, que comercializa produtos infantis e de cuidados maternos. A empresa também assina conteúdos digitais no Youtube e demais plataformas de música e vídeos para imersão do público em um universo lúdico, conectando a marca ao dia a dia das famílias. Com a chegada de Ravi, segundo filho do casal (hoje com seis meses), mais uma conta pré-nascimento também foi criada e acumula um total de 513 mil seguidores. Reprodução: alô alô Bahia / Reprodução: Turmatube Muitas vezes o que ocorre nesta relação administrador de carreira versus pai/mãe, é um natural conflito de interesses. Ao mesmo tempo que desejam proteger suas crianças e procurar o bem estar, também precisam investir tempo e recursos significativos, muitas vezes à custa da própria vida pessoal e profissional, na gestão dessa carreira. Alguns casos de gerenciamento de carreira por familiares repercutiram em âmbito nacional e internacional, como no
Editorial
Estimado leitor, neste ano celebramos o aniversário de 35 anos da Revista Primeira Mão. Este laboratório de jornalismo que existe desde 1989, já fez parte da rotina de muitos estudantes do curso de Jornalismo, primeiro como jornal e agora como revista, e de muitos leitores interessados no que os universitários têm a dizer. 35 anos marcam três décadas e meia de pluralidade de vozes. Marcam tenacidade editorial, apuração eficiente, cobertura diversa, expressão de um tempo e principalmente a formação de novos jornalistas. Os comunicadores que entraram na Primeira Mão não foram os mesmos que saíram dela e isso permanece. Temos novas histórias, novos repórteres, novas ambições, novos propósitos e nova identidade visual. Mas fique ciente, estimado leitor, que o novo e o histórico – porque nos recusamos a chamar qualquer produção jornalística de velha ou ultrapassada – se juntam aqui com o mesmo objetivo: trazer temas de relevância social da esfera cotidiana e promover debates emancipatórios de interesse dos universitários e de toda a comunidade. A edição #163 chega em um momento em que as fronteiras entre o real e o virtual estão cada vez mais difusas. Vivemos uma sobrecarga de informações que molda nosso modo de pensar e agir. Mas ainda é possível resistir a esse ritmo acelerado. Podemos optar por desacelerar, refletir e abrir espaço para vozes críticas. Acreditamos no poder do jornalismo que questiona, propõe e transforma. Viemos para ficar. Como primeira editora-chefe da nova equipe da revista, gostaria de citar minha antecessora Lara Santoro: “Os fatos não falam por si só, é preciso entendê-los, contextualizá-los e vislumbrar as perspectivas que existem. Contar as histórias a partir da realidade de quem, muitas vezes, é invisibilizado. Escutar quem, muitas vezes, é silenciado. Entrever aquilo que, muitas vezes, pode estar escondido.” Espero que tenhamos escutado e escrito aquilo que você queira ouvir e ler, estimado leitor.Somos gratos por produzir jornalismo de qualidade na universidade e mais gratos ainda por poder compartilhar estes materiais com vocês. E sobretudo, espero que façam uma excelente leitura!