André Cypreste

A medida adotada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de sobretaxar produtos brasileiros em até 50% segue pressionando a economia capixaba, embora algumas categorias tenham conseguido escapar da alíquota mais pesada. Após negociações diplomáticas e pressão de setores estratégicos americanos e brasileiros, o governo norte-americano publicou uma lista de exceções que poupa parcialmente segmentos relevantes do agronegócio e da indústria.
Ficaram de fora da nova sobretaxa de 40% (que somada aos 10% iniciais formaria o tarifaço de 50%) produtos como aeronaves civis e peças (incluindo os da Embraer), petróleo bruto e gás natural, fertilizantes, polpa de madeira, minério de ferro, metais preciosos (ouro e prata), além de suco de laranja e castanhas brasileiras. Esses produtos continuam sujeitos apenas à tarifa de 10% estabelecida anteriormente e representam entre 30% e 45% de todas as exportações brasileiras para os Estados Unidos.

Apesar dos esforços diplomáticos, diversos setores capixabas cruciais seguirão enfrentando a tarifa integral de 50%, que começou no último dia 6 de agosto. Entre os mais afetados estão o café, o gengibre, os pescados como atum e peixe congelado, o mamão, a pimenta-do-reino (inclusive a exportada via Vietnã) e as rochas naturais (menos os quartzitos). Apenas nos primeiros seis meses deste ano, 51% da celulose e 41% do café solúvel exportado pelo Espírito Santo tiveram como destino os Estados Unidos.
A resposta no âmbito nacional e estadual
O secretário de Agricultura do Espírito Santo, Enio Bergoli, afirma que o mercado de café está parcialmente paralisado e que muitos contratos não estão sendo renovados, o que compromete o escoamento da produção. Ele alerta que, se o Estado não conseguir acessar novos mercados em tempo hábil, os preços vão cair e toda a cadeia produtiva será afetada, desde o exportador até o pequeno agricultor.
A situação é particularmente delicada no caso do gengibre, cuja exportação ao mercado norte-americano representou mais da metade do volume comercializado entre janeiro e junho. “A cada dia sem contratos novos, os prejuízos se acumulam. Isso afeta não só os exportadores, mas toda a cadeia produtiva, inclusive o produtor rural. [O gengibre] não têm mercado interno capaz de absorver o excesso de oferta, e a consequência direta será a queda nos preços e perda de renda no campo”, concluiu o secretário.
Como resposta ao impacto tarifário, o Governo Federal anunciou a liberação de R$ 2 bilhões em linhas de crédito especiais para exportadores brasileiros afetados. Os financiamentos terão juros subsidiados e serão operacionalizados por instituições como o BNDES e o Banco do Brasil. Além disso, foi estabelecido um canal direto de negociação com mercados da Europa, Ásia, América Latina e África, com o objetivo de redirecionar parte da produção que perderá espaço nos Estados Unidos.
No plano estadual, o governo do Espírito Santo anunciou um pacote emergencial de R$ 450 milhões. A maior parte desse valor, cerca de R$ 200 milhões, virá da reestruturação do Fundo de Desenvolvimento Agropecuário (FDA-ES). Outros R$ 150 milhões serão captados por meio de parcerias com investidores estrangeiros, voltadas para a industrialização de produtos exportáveis. O restante, R$ 100 milhões, será financiado por uma linha de crédito com garantia da União, destinada a capital de giro para empresas exportadoras.
Quais os próximos passos?
O economista Pablo Lira, diretor do Instituto Jones dos Santos Neves, aponta que o Espírito Santo tem um grau de abertura econômica duas vezes maior que a média nacional, o que o torna mais vulnerável a choques externos. Apesar disso, ele vê a possibilidade da medida se voltar contra a população americana: “A elevação das tarifas tende a pressionar os preços internos, aumentar o custo de vida e até gerar desemprego. O impacto negativo começaria dentro da própria economia dos EUA.”
Segundo Lira, o Estado e o Brasil precisam diversificar seus mercados e fortalecer laços com blocos como a União Europeia, o Mercosul, além de países da Ásia e da África. “É nas crises e incertezas que surgem as grandes decisões estratégicas. O Espírito Santo deve aproveitar esse momento para repensar e expandir sua atuação internacional”, concluiu.
Caso a tarifa de 50% se mantenha ao longo do semestre, estima-se que o Espírito Santo possa perder até R$ 3 bilhões em receitas de exportação. A expectativa é de que esse impacto gere efeitos em cadeia sobre o mercado de trabalho, os investimentos e a arrecadação pública. O governador Renato Casagrande tem se manifestado em entrevistas à imprensa nacional sobre a importância de uma reação conjunta dos estados e do governo federal para enfrentar os efeitos das tarifas impostas por Trump. Ele defende ações coordenadas de diplomacia comercial, incentivo à agregação de valor nos produtos e apoio direto aos produtores.
Enquanto as articulações diplomáticas continuam, o Espírito Santo se organiza para enfrentar um dos seus maiores desafios no comércio exterior das últimas décadas, buscando manter sua competitividade internacional e proteger a base produtiva que sustenta boa parte da economia local.