Cinema capixaba em movimento

Entre cineclubes, festivais e apoio institucional, o Espírito Santo se destaca como celeiro de novas vozes e olhares que transformam o audiovisual nacional.


A produção audiovisual capixaba tem se consolidado como um dos principais instrumentos de expressão cultural do estado. As obras se destacam em curta-metragens, embora a produção de longas tenha crescido nos últimos anos, impulsionada por editais públicos, festivais e laboratórios de desenvolvimento. O cenário é marcado pela diversidade de gêneros, com forte presença de dramas sociais, documentários e produções que exploram questões identitárias e territoriais, como cultura periférica, negritude, gênero e pertencimento.

A circulação dessas produções acontecem principalmente por meio de festivais locais e nacionais, como o Festival de Cinema de Vitória, a Mostra de Cinema de Tiradentes, o Festival de Brasília e o Cine PE. Muitos também são exibidos em cineclubes, mostras universitárias, plataformas de streaming independentes, e em projetos de itinerância cultural pelo interior capixaba. 

Intitulado o maior evento audiovisual do estado, o Festival de Cinema de Vitória traduz a importância de eventos que reforcem o protagonismo do cinema capixaba e nacional. Mais do que exibir filmes, o tradicional evento cinematográfico “estimula a formação de plateia para o cinema brasileiro, através do lazer e da cultura, democratizando o acesso e o espaço de todos pela sétima arte e, desta forma, aproximando capixabas e turistas numa grande festa do audiovisual produzido no Brasil”, afirma o festival. 

A democratização do acesso é uma diretriz essencial para iniciativas como o Movimento Cidade, que atua como um festival de artes integradas com entrada gratuita, por exemplo. “Entendemos que é muito importante a aderência de novos públicos às linguagens do audiovisual, que são cada vez mais múltiplas e dinâmicas. Como somos um festival gratuito e realizado com recursos da Lei de Incentivo à Cultura, a acessibilidade dos conteúdos e a democratização do acesso são itens fundamentais”, explica a assessoria do projeto.

A curadoria do Movimento Cidade também faz questão de valorizar as produções capixabas. “Por sermos um Festival nascido no Espírito Santo, na curadoria, as produções locais são sempre prestigiadas. Em anos anteriores, realizamos a Mostra Cena Capixaba, 100% focada em filmes locais”, completa. Com uma programação diversa e aberta a todas as linguagens artísticas, a produtora cultural atua de forma estratégica na valorização da identidade regional por meio da arte.

Vale lembrar que esse movimento de valorização cultural tem forte apoio institucional no estado. O curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) desempenha papel decisivo no desenvolvimento do setor audiovisual capixaba. Os universitários entram pelas portas da instituição com um único sonho e saem como jovens talentos da cinematografia. 

Para Maria Vitória Mourenço, atriz e cineasta pela Universidade Federal do Espírito Santo, o audiovisual é uma ferramenta poderosa justamente por sua capacidade de tornar temas complexos acessíveis. “Um bom filme consegue alcançar tanto quem já entende do assunto quanto quem nunca nem ouviu falar sobre aquilo”, declara a cineasta. A cultura, especialmente por meio do cinema, cumpre um papel essencial: preservar a memória, provocar o pensamento crítico e promover o sensível, muitas vezes invisível aos olhos.

Apesar dos avanços no setor audiovisual, o acesso ao cinema ainda enfrenta um obstáculo significativo: quase 40% da população brasileira vive em municípios sem salas de exibição. Até 2018, segundo dados do IBGE, 39,9% dos brasileiros residiam em cidades que não contavam com sequer uma sala de cinema. Esse cenário evidencia uma profunda desigualdade no acesso não só ao cinema, mas também a outros equipamentos culturais, como museus e teatros. A pesquisa do Sistema de Informações e Indicadores Culturais mostra que essa exclusão cultural varia de acordo com fatores como sexo, cor ou raça, faixa etária e nível de escolaridade, reforçando barreiras estruturais que ainda limitam o pleno exercício dos direitos culturais no país.

A falta de acessibilidade cultural não é apenas uma lacuna no entretenimento, é uma exclusão que afeta diretamente o desenvolvimento humano, social e econômico. O impacto do acesso ao cinema vai além da formação de cidadãos engajados. Ele permite que novas narrativas ocupem as telas, dando visibilidade a histórias, rostos e realidades historicamente marginalizadas. “Ver filmes feitos por capixabas muda muita coisa, principalmente o olhar que a gente tem sobre nós mesmos e sobre o lugar onde vivemos. Quando a gente se vê representado nas telas, nas histórias, nos sotaques, nos cenários que reconhece, a sensação é outra. Dá um orgulho, cria uma conexão que vai muito além do entretenimento. É como se alguém dissesse: ‘isso aqui também importa, também merece ser contado’. E mais do que isso, esses filmes mostram pro resto do Brasil que o Espírito Santo existe, tem cultura, tem artistas, têm histórias potentes pra contar’”, destaca Maria Vitória. 

A Primeira Mão é uma revista-laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Espírito Santo, totalmente desenvolvida por estudantes, sob orientação de professores. Além de sua versão em PDF, a partir de 2024, a revista também conta com uma versão digital, ampliando seu alcance e acessibilidade. Em 2013, a Primeira Mão foi uma das cinco finalistas da região Sudeste para o prêmio Expocom de melhor revista-laboratório impresso.

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